Pesquisa recém-publicado na Nature indica que a redução precoce da sensibilidade visual - perda da acuidade visual, visão de contraste e de profundidade - sintomas que caracterizam a catarata, indica maior risco de desenvolver demência. Realizada no Reino Unido com 9 mil participantes a pesquisa associou o Teste de Sensibilidade Visual (TSV) que mede a velocidade de processamento visual e o tempo de reação no acompanhamento de imagens em movimento que está diretamente ligado à segurança no trânsito, a duas ferramentas padrão ouro de triagem de demência: o HVLT e o SF-EMSE.
Após 15 anos os 500 participantes que incialmente apresentaram baixa sensibilidade visual apresentaram demência, indicando que o TSV pode ser integrado a outros testes cognitivos no rastreio de risco e diagnóstico precoce de doenças degenerativas do cérebro como o Alzheimer.
Segundo o oftalmologista Leôncio Queiroz Neto, diretor executivo do Instituto Penido Burnier em Campinas, a catarata, opacificação do cristalino, é a maior causa de cegueira evitável e um dos principais problemas de saúde pública no Brasil. Isso porque, explica, o País tem uma população de 24 milhões entre 50 e 59 anos e nesta faixa etária 1 em cada 4 já tem catarata, incidência bastante superior à estimada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) nesta faixa etária.
"O problema é que nos consultórios muitos pacientes adiam a cirurgia. Isso desregula todo o metabolismo e pode provocar outros problemas de saúde, entre eles diabetes, hipertensão arterial, depressão e a insônia que ameaçam a saúde do cérebro", salienta.
Queiroz Neto ressalta que este não é o primeiro estudo que associa catarata e demência. Pesquisa publicada anteriormente no JAMA, mostra que a cirurgia de catarata reduziu em 30% o risco de Alzheimer. "É claro que nem todas as pessoas que têm catarata desenvolvem demência, até porque, a doença é multifatorial. Além do envelhecimento, pode ser causada por trauma, diabetes, exposição ao sol sem lentes com proteção ultravioleta, tabagismo, vape e pelo uso contínuo de alguns medicamentos, entre eles os corticoides, estatinas e antidepressivos. O problema é a adaptação à perda da sensibilidade visual que afeta a saúde do cérebro por ser nele que as imagens são processadas".
Como a cirurgia evita a demência
Queiroz Neto explica que a cirurgia de catarata substitui o cristalino opaco por uma lente intraocular transparente. Feita entre 15 e 20 minutos com anestesia local aumenta a quantidade de luz azul que chega à retina e estimula suas células ganglionares que são fotossensíveis e estão relacionadas à cognição.
A cirurgia, explica, estimula as células ganglionares da retina que se comunicam com o cérebro através do nervo óptico, regulando desta forma o controle de nosso relógio biológico ou ciclo circadiano no período de 24 horas. Por isso, combate a insônia que intoxica o cérebro, facilita o controle do diabetes e outras alterações sistêmicas que influem na desempenho cognitivo.
O oftalmologista ressalta que embora a pesquisa seja inconclusiva por não abordar que o gene APOE4 relacionado à demência deixa claro que adiar a cirurgia de catarata tem efeito cascata sobre a saúde e cognição. Por isso, o consenso é operar quando a visão começa a atrapalhar a realização das atividades diárias, conclui.