Gostaria de informar que as matérias publicadas neste espaço, são de minha inteira responsabilidade. Não existindo o interesse em criar polêmica, a intenção maior é de informar aos leitores, sobre novas interpretações em assuntos que suscitam dúvidas. Mesmo após crítica por quem não apreciou as observações por mim escritas, continuo acreditando na importância de estudos que tragam informações novas, tanto para a categoria, como para o público em geral. Principalmente quando assuntos podem ser vistos sob a luz de um novo prisma dentro de realidades e evidências científicas atualizadas.
A princípio o termo "mono visão" está mal construído. Não representa a realidade de quem utiliza desta técnica.
Mesmo porque, mono-visão, é a terminologia utilizada para caracterizar pessoa que tem apenas um olho, ou seja, monocular. Enquanto que a situação criada em contatologia pela "mono-visão", não é uma visão de um só olho. Pelo contrário a condição provoca uma visão de "biocularidade", ou seja, cada olho vai ter uma propriedade de visão: um com o foco adequado para visão longe e o outro para perto.
Neste contexto deve existir o entendimento que em visão podem ser relatadas três situações diferenciadas no que se refere à efetividade da visão.
* Monocular é o portador de apenas um olho. Não possui estereopsia. Pode conseguir certa visão rudimentar para definir distâncias em virtude de adaptação cerebral para a situação.
* Binocular é o portador de dois olhos que funcionam em conjunto, ocasionando a visão em 3D ou estereopsia, visão estéreo.
* Biocular é uma pessoa que, embora tenha os dois olhos com boa visão, cada um percebe a imagem de forma individual. Quando um olho fixa, o outro desvia, sofrendo um fenômeno conhecido por "alternância" e "supressão".
A situação não permite visão de estereopsia, sendo esta ocasional e rudimentar. O cérebro está adaptado para a situação da "biocularidade".
Será uma boa técnica a mono-visão com lentes de contato?
Ou pode trazer transtornos ao usuário?
Acredito ser necessário reportar que a Optometria e os optometristas tem como princípio a prescrição de correções ópticas que corrijam as deficiências de visão de maneira integral. Podendo ser através de lentes em óculos ou de contato. Um dos objetivos característico da nossa atividade é garantir uma visão de qualidade. Procurando sanar os defeitos da acuidade visual, da binocularidade, da estereopsia e certamente de situações provocadas por anisometropias*.
Nas anisometropias encontramos origem de várias situações de desconforto, queixas e defeitos da visão. Os sintomas estão na dependência da magnitude ou tamanho da diferença. Como exemplo, diferença acima de 1.00 (uma) dioptria pode apresentar sintomas como dificuldade de fusão, confusão, diplopia*, cansaço visual, sono, cefaleia, astenopia* etc. É uma situação frequente nos consultórios que é sanada com o equilíbrio conseguido após a correção dos dois olhos.
Outras vezes, em anisometropias maiores, acima de 2 (duas) dioptrias, estas podem provocar supressão, diplopia, dificuldade de visão em 3D (estereopsia), estrabismo, ambliopia, correspondência sensorial anômala (CSA), baixa cognição, dificuldade no aprendizado, baixa sensibilidade ao contraste, diminuição do campo visual etc.
A situação é observada com frequencia quando uma pessoa é candidato e precisa de avaliação da visão para motorista e/ou em exames de aptidão para cargos públicos. Atualmente já existem várias empresas que exigem exames de visão para admissão de candidatos. Nestes casos, a avaliação não se restringe a visão central (acuidade visual). Também é examinada a binocularidade, campo visual e visão de cores.
Neste contexto, o profissional que corrige visão, deve se esmerar na determinação de uma prescrição que proporcione a melhor acuidade, boa binocularidade, campo visual dentro da norma e não provoque transtornos na motilidade do seu paciente. Possibilitando não só uma visão ótima em termos de acuidade, mas também conforto visual, equilíbrio e qualidade de vida. No caso de testes específicos, existirá uma adequação para enfrentar qualquer avaliação ou exame de visão.
Talvez seja necessária complementar que o campo visual total para a visão em 3D ou estereopsia só é conquistado com boa visão binocular. Quando a pessoa vê com somente um olho ou com o outro deficiente, a estereopsia passa a não existir ou cai de rendimento. Ao diminuir o campo de visão, pode ocorrer a supressão e confusão, antes inexistentes. A própria cognição e a sensibilidade ao contraste sofrem alteração, podendo diminuir.
São situações comprovadas cientificamente.
Quando se fala em campo de visão obtido entre o campo monocular (individualmente) e o binocular, ocorre um incremento de campo visual em torno de 30% ou mais de aumento com a visão binocular. Significando que a matemática não é aplicável em questão de visão. Visto que, em termos de visão 1 + 1 não equivale a 2. A natureza contribui, proporcionando uma conta especial. Em questão da visão: 1 + 1 = 3.
Com estes conhecimentos básicos à mão, não temos como não reconhecer que a "mono-visão" com lentes de contato, por sua projeção de uma biocularidade artificial, irá provocar sempre uma descompensação na visão binocular, com certeza. A qual nível? Só se forem feitas avaliações, com e sem a mono-visão, quando deverão ser obtidas medidas de campo visual, sensibilidade ao contraste, cognição, equilíbrio, acuidade e binocularidade.
Por outro lado, o contatólogo se depara com uma situação que precisa ser analisada com realismo e imparcialidade. Sempre que um cliente procura a óptica com uma prescrição e diz não querer usar óculos, apesar de sentir a necessidade do uso da correção, qual será a solução?
Podemos tentar "convencer" a pessoa a usar óculos. Caso isto não seja possível, como resolver o transtorno? Afinal o cliente precisa da correção para melhorar sua visão de longe e também de perto.
Deixar sem resolver acaba sendo uma atitude conflitante e antiética. Visto que o cliente confia no seu trabalho, por isto o procurou. E não quer óculos por estética. Acredita que os óculos alteram seu perfil, modificam sua silhueta. Em fim, antecipadamente sabe que não usará óculos, mesmo precisando.
O caso caracteriza uma antinomia*?
A decisão caberá, a princípio, ao profissional da visão. Somente após executar todos os testes que lhe permitem apreciar as mudanças com os "transtornos" ou "vantagens" que esta técnica pode estar causando ao paciente, poderá ter orientação para uma decisão mais acertada.
Após explicar cada passo, mostrando ao paciente como o novo modo de "ver" e "enxergar" estarão implicando no seu dia a dia. Com certeza cada caso caracteriza situação diferenciada, sobretudo levando em conta as atividades diárias de cada pessoa. Uma dona de casa será um caso bastante diferente de uma pessoa que trabalha como gerente de banco ou em operário com atividades laborais em uma fábrica.
Somente após estas avaliações, com testes específicos, poderá ser determinado, dentro da apreciação do usuário, em cumplicidade com o profissional da visão, se a técnica pode e deve ser adotada sem grande transtorno.
Talvez fosse conveniente, quando a técnica for utilizada, que o profissional tenha o cuidado de informar ao cliente que junto com as lentes de contato, levará de brinde uma anisometropia.
*A antinomia é a presença de duas normas conflitantes, válidas e emanadas de autoridade competente, sem que se possa dizer qual delas merecerá aplicação em determinado caso concreto. (lacunas de colisão).
*Anisometropia é a terminologia utilizada para definir a diferença da magnitude da ametropia entre os dois olhos. Nesta situação um olho tem um valor ou necessidade diferente do outro. Popularmente pode ser definida como sendo a palavra usada para caracterizar a diferença de "grau" entre os olhos. Podem ser diferenças pequenas ou grandes. Contudo, qualquer diferença caracteriza uma anisometropia.
*Diplopia ou visão dupla, é a condição em que uma pessoa vê duas imagens de um mesmo objeto. Na diplopia o cérebro não consegue reuni-las e as vê como duplas ou com sobra.
*Astenopia é um termo geralmente utilizado para descrever queixas relacionadas a erros de refração, desequilíbrio dos músculos extraoculares incluindo dor ao redor nos olhos, ardência e coceira das pálpebras, fadiga ocular e cefaléias.
Conselho Regional de Óptica e Optometria de São Paulo
Professor Vilmario Antonio Guitel - Presidente
Técnico em Óptica - SENAC SP
Técnico em Óptica e Optometria - Especialista pelo MTE
Bacharel em Optometria - UNC - Canoinhas SC
Pós Graduação Alta Optometria - UNC
Pós Graduação Magistério do Curso Superior - UNC
CROOSP 02.0003